Desce pelos acordes imenso rio, chuvas de violões despencam
na floresta da alma do cantador - soa num Dó, uma sonoridade de ilusões,
amazonicamente, no templo das águas e dos violões...
Estirão de
praias submersas, onde as águas se levantam pela força dos temporais. Arco-íris
ligando a mata e o rio, a capoeira e o cio, a poesia e os igarapés.
Curvas,
enseadas, ponteios, as águas feito chuvas, trazem para nós a gula, o sofreguidão - rente a cabeceira do Patacho,
beira de rio, de riacho, vinga um acorde maior, violão de cancioneiro fobó,
cantigas encantadas do tempo da minha avó.
Cada saída
de lua, feito mulher nua, no alto do céu, prende os olhares ao léu, roucos
estampido das pedras, rolando dentro das nuvens, que anunciam um temporal...
águas torrenciais deixam aflição, três acordes perfeitos no meu violão, -
soando no telhado o bailado dos pingos, clima de poesia, soar de sinos, dos
apaixonados um hino, faz da vida uma canção.
O verão
que distante, a espera da poesia errante, as águas e os retirantes; a boiada
precisa deixar o lugar... As palavras vão vincando a passagem do gado, o
violeiro sem berrante dá o recado, canta as mágoas, os amores e a solidão.
Parte uma
canoa desvairada, singrando as águas encantadas, violões são como estradas,
caminhos de muitas direções... O poeta finge pensando palavras, dando vida nova
as velhas xaradas, é sutil pela madrugada e sublime entre o verso e o rio.
Que neste
imenso verde mata, galhos, capinzais e rios, violões despertam vazios nessa
floresta inundada... Trazem seus acordes febris, crescendo de dentro da raiz,
dos costumes enraizados...
Passa
curumim, passa moça bela, passa a cabocla esperando o caboclo na janela, passa
o temporal e a canoa a vela leva a tarde para descansar no matagal...
Águas
molhando um choro de saudade, violões violando a canção da liberdade, pessoas
esperando os barcos com ansiedade, em cada porto, em cada cidade... Um rio é
como um Sol, acorde perfeito maior, a Amazônia é um arrebol, um calor de descer
o suor.
O tempo
leva o pensamento longe, o caboclo desperta na alvorada das revoadas,
cantarolas de pássaros pras bandas da terra firme, eia boiada! Chão de terra
aguada ficou na várzea, são águas passadas...
O poeta é
difamador da palavra, arranja briga entre violão e água, faz magia nos versos
da mulher amada, desce a correnteza dos sonhos, mirando a lua que jamais o
abandona. Poesia é o que se sonha, são águas e violões na Amazônia.